quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Memórias de leitura

Quando chegava o fim da tarde, lá pela minha terceira ou quarta primavera, a minha mãe me carregava pro quarto, me botava na cama e abria um livro grande de capa dura. Eu, de bruços na cama, escutava a voz da minha mãezinha cantando as histórias da Branca de Neve e da Chapeuzinho Vermelho. Mas eu gostava mais da primeira opção. Mamãe fazia uma voz estranhíssima quando o espelho mágico entrava em cena. Engraçado que canto até hoje as musiquinhas.
A minha mãe me acostumou mal. Qualquer história só teria graça se ela cantasse pra mim. Ler... Só ler... E ainda mais sozinha... Era no mínimo muito chato. Pense que dava preguiça quando eu via todas aquelas letras que enchiam todas aquelas muitas páginas. Digo com total firmeza que ver as crueldades do Pica-pau na TV era muito mais interessante pra mim. E minha mãe também adorava essa idéia de eu estar hipnotizada com todas aquelas cores e sons esquisitos, e assim mamãe não tinha trabalho.
Fui crescendo (no sentido “ficando mais velha” porque Deus não me abençoou com hormônio de crescimento) e fui forçada a ler os malditos paradidáticos da escola. Malditos sim. Eu perdi muitos episódios repetidos de Chaves por conta deles. Tanto sacrifício só pra saber o nome do filho da vizinha do irmão mais velho da personagem principal. Um livro que me marcou profundamente foi “Batalha de Mamulengos”. Creio que se eu tivesse lido ontem eu teria gostado bastante. Quer dizer, não sei. A minha amedrontadora professora da 4º série, Tia Zélia, mandou que nós formássemos grupos de quatro pessoas para fazer um resumo deste livro (em forma de livro). Confuso? Deveras. E eu e meus colegas não sabíamos nem por onde começar. A gente não sabia como fazer um resumo. “É só extrair o mais importante”. Mas olha só: um livro com mais de cem páginas tinha muitas partes importantes. Por exemplo: a cor da primeira roupa do mamulengo mais velho podia estar numa questão de prova. Dividimos o livro em quatro partes. Cada componente do grupo ficava responsável por resumir a sua parte fosse lá o que isso significava. No fim juntaríamos tudo e montaríamos o livro. A minha prima mais velha disse que era só mudar algumas palavras do texto original e copiar o resto. Eu passei um fim de semana fazendo isso. E até hoje eu não sei resumir bem. Dá pra perceber, né?
Depois deste episódio eu fiquei um bom tempo sem querer saber de livro. Minha mãe me dava alguns de Pedro Bandeira, mas eu não passava do terceiro capítulo. Até que meu irmão ganhou de presente de Natal um livro meio grossinho com umas letras verde-esmeralda na capa: “Harry Potter e a pedra filosofal”. Eu tomei posse desse livro. E o comi rapidamente para poder partir para “Harry Potter e a câmara secreta”. Logo em seguida conheci o meu volume favorito da série: "Harry Potter e o prisioneiro de Askaban”. Eu gostava de ler as coisas macabras e ruins que aconteciam com o protagonista. Até que comecei a ter raiva do mocinho. Por conta dele as minhas personagens prediletas morreram: Cedrico morreu em “ O cálice de Fogo”, Sirius Black morreu em “ A ordem da Fênix” e Dumbledore morreu em “O enigma do príncipe”. Depois de todo esse tempo de luto eu queria que o desgraçado do Harry Potter morresse também. Quando eu soube que J. K. Rowlling não iria pôr um fim merecido na sua personagem principal eu desisti de ler o último livro, cujo título eu nem sei.
Nos intervalos de um H.P. para outro eu me voltei aos livros de Pedro Bandeira que minha mãe me dera, aos livros do vestibular (O guarani, São Bernardo, O auto da compadecida, etc.). Li também muito manga, livros fúteis de Meg Cabot, revistas diversas, tudo o que passava eu lia. Até fiz parte de uma competição “quem lê mais” na escola. Conheci “Drácula" de Bram Stoker, "Pollyanna" e "Pollyanna moça" de Eleanor H. Porter, “As Crônicas de Nárnia” de C. S. Lewis (que eu li para minha irmã mais nova), e o fabuloso “O pequeno príncipe” de Antoine de Saint-Exupéry.
No meu terceiro ano do ensino médio eu comecei a querer ir mais a fundo nos estudos de literatura. Quis complementar um futuro curso de jornalismo com o curso de Letras. Quando eu entrei na universidade me deparei com um universo tão amplo que eu não sabia o que “saborear”. Belisquei “O rapto de Helena” de Colutos, mais um pouco da “Eneida”, um bocadinho da Ilíada. Arranjei espaço pra “A metamorfose” de Kafka, que não me causou tanto efeito como eu imaginava. Também teve “Hamlet” que estava meio difícil de engolir, mas no fim foi muito satisfatório. Porém o grande banquete foi “Dom Quixote”. Enlouqueci com o livro assim como Quixote enlouqueceu com os romances de cavalaria. Hoje é meu livro de cabeceira. Meu prato preferido. De sobremesa eu tive “Budapeste” de Chico Buarque. Por mais que tenha gente que diga que ele “não rima” eu discordo, pois a leitura foi docemente gostosa. Extra-classe eu me aventurei pela literatura sangrento-medieval de Bernard Cornwell. Um historiador detalhista que conta com muitos crânios abertos as histórias dos anglo-saxões, da guerra dos cem anos, do rei Arthur, etc. Um tempo desse me emocionei com o “Caçador de pipas”. Atualmente só os livros acadêmicos me ocupam. Todavia estou tentando fazer sobrar um pouco de energia pra ler uns livrinhos aí.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Recado pro menino da boca miúda.

- Ei, o moço da boca miúda esteve por aqui.
- Hum...
- E disse qu quer falar contigo.
- Eu não posso. Mas diga a ele que eu adoraria... Ai, eu não posso.
- Mas e se o moço insistir?
- Eu quero. Mas não posso.
- Ah. Ele disse que nã pára de pensar em você.
- Você sabe que eu também não páro de pensar nele.
- E então?
- Não posso.
- Deixe de teimosia.
- Não me lembra mais...
- Ouxe, lembro sim. Você gosta de bocas miúdas.
- Já me deram muito trabalho.
- Ora essa, cabrita! Uma vez não mata ninguém.
- Só se ele trouxer melancia.
Amor, então também acaba?
Não, que eu saiba.
O que eu sei
é que se transforma
numa matéria-prima
Que a vida se encarrega
de transformar em raiva.
Ou em rima.

Leminski

sábado, 6 de setembro de 2008

Nalgum Lugar
(E.E. Cummings; tradução de Augusto de Campos)

nalgum lugar em que eu nunca estive, alegremente além
de qualquer experiência, teus olhos têm o seu silêncio:
no teu gesto mais frágil há coisas que me encerram,
ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto

teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
embora eu tenha me fechado como dedos, nalgum lugar
me abres sempre pétala por pétala como a Primavera abre
(tocando sutilmente, misteriosamente) a sua primeira rosa

ou se quiseres me ver fechado, eu e
minha vida nos fecharemos belamente,de repente,
assim como o coração desta flor imagina
a neve cuidadosamente descendo em toda a parte;

nada que eu possa perceber neste universo iguala
o poder de tua imensa fragilidade: cuja textura
compele-me com a cor de seus continentes,
restituindo a morte e o sempre cada vez que respira

(não sei dizer o que há em ti que fecha
e abre; só uma parte de mim compreende que a
voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas


Spik (sic) Tupinik
(Glauco Mattoso)

Rebel without a cause, vômito do mito
da nova nova nova nova geração,
cuspo no prato e janto junto com palmito
o baioque (o forrock, o rockixe), o rockão.
Receito a seita de quem samba e roquenrola:
Babo, Bob, pop, pipoca, cornflake;
take a cocktail de coco com cocacola,
de whisky e estricnina make a milkshake.
Tem híbridos morfemas a língua que falo,
meio nega-bacana, chiquita-maluca;
no rolo embananado me embolo, me embalo,
soluço - hic - e desligo - clic - a cuca.

Sou luxo, chulo e chic, caçula e cacique.
I am a tupinik, eu falo em tupinik.
Catar feijão
(João Cabral de Melo Neto)

Catar feijão se limita com escrever:
joga-se os grãos na água do alguidar
e as palavras na folha de papel;
e depois, joga-se fora o que boiar.
Certo, toda palavra boiará no papel,
água congelada, por chumbo seu verbo:
pois para catar esse feijão, soprar nele,
e jogar fora o leve e oco, palha e eco.

Ora, nesse catar feijão entra um risco:
o de que entre os grãos pesados entre
um grão qualquer, pedra ou indigesto,
um grão imastigável, de quebrar dente.
Certo não, quando ao catar palavras:
a pedra dá à frase seu grão mais vivo:
obstrui a leitura fluviante, flutual,
açula a atenção, isca-a como o risco.


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Madrigal tão engraçadinho
(Manuel Bandeira)

Teresa, você é a coisa mais bonita que eu vi até hoje na minha vida,
inclusive o porquinho da índia que me deram quando eu tinha seis anos.

Porquinho-da-índia

(Manuel Bandeira)

Quando eu tinha seis anos,
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!
Levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos mais limpinhos
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas...
- O meu porquinho-da-índia foi a minha primeira namorada.

Namorados
(Manuel Bandeira)

O rapaz chegou-se para junto da moça e disse:
- Antônia, ainda não me acostumei com o seu corpo, com a sua cara.
A moça olhou de lado e esperou.
- Você não sabe quando a gente é criança e de repente vê uma lagarta listada?
A moça se lembrava:
- A gente fica olhando...
A meninice brincou de novo nos olhos dela.
O rapaz prosseguiu com muita doçura:
- Antônia, você parece uma lagarta listada.
A moça arregalou os olhos, fez exclamações.
O rapaz concluiu:
- Antônia, você é engraçada! Você parece louca.



sexta-feira, 29 de agosto de 2008

As descontinuidades da interação face a face

Amiga do Bú, esse é pra você!

Bem... Por muito tempo se estudou a língua falada baseada na língua escrita. Alguns teóricos dizem que a escrita é perfeita e que devemos falar como escrevemos. Isso é uma utopia, minha gente. Vejamos só... Quando a gente escreve, a gente tem tempo pra pensar. Nós lemos o texto escrito, relemos, trelemos, corrigimos e assim vai. Mas vamos dar uma oportunidade para esses tais teóricos se explicarem um pouco, né?

1. Linguagem escrita X Linguagem falada

Escrita

· Planejada;

· Não-fragmentada;

· Completa;

· Elaborada;

· Predominância de frases complexas com subordinação abundante;

· Emprego freqüente de passivas.

Fala

· Não-planejada;

· Fragmentada;

· Incompleta;

· Pouco elaborada;

· Predominância de frases curtas, simples ou coordenadas;

· Pouco uso das passivas.

Ta... Já disseram muita coisa... Você concorda com isso? Você acha que a escrita pode ser comparada com a fala? Você acha que a fala é desorganizada? Que a escrita sempre vai ser linda e impecável? Se a resposta é sim, o que você está fazendo no curso de Letras? Se a resposta for não, eu gosto de você! Mas quem disse sim e quem disse não... Qualquer um pode ler até o fim.

Essas duas modalidades da linguagem (escrita e fala) podem se misturar, às vezes. Quando estamos num tribunal, ou numa palestra científica, ou num casamento (se você for o noivo ou noiva e estiver repetindo aquelas coisas chatas que o padre diz), nós usamos uma linguagem mais formal, mais certinha, pensada, planejada anteriormente, com mais tempo para organizar a idéia. Falamos como se tivéssemos ensaiado aquilo. E quando estamos no msn? Como escrevemos. Existem aquelas pessoas que escrevem tudo direitinho. Agora, quando estas fazem isso lentamente... Ah! A gente perde a paciência. Porque no Messenger nós temos que ser rápidos, isso acontece por causa da mensagem instantânea. Feito na hora, como uma conversa, como a fala.

Assim nós vemos que, simplesmente, nós não podemos dizer que uma modalidade é mais importante que a outra. Mas os gramáticos teimam em dizer que a língua escrita é superior à fala, pois possui uma organização, possui regras, possui uma gramática Felizmente alguns lingüistas têm defendido que a língua falada possui sim uma organização. O nosso grupo de pesquisa chama essa organização de Gramática Interacional, mas isso não é oficial... Autores importantes como Marcuschi, Koch e , se eu não me engano, Rodolfo Ilari, falam de uma gramática da fala. L. A. Marcuschi fala que apesar do aparente caos lingüístico, nós conseguimos adquirir conhecimento através da interação.

É justamente desse ‘caos lingüístico’ que vamos falar nesse texto. Mas antes de chegar nas famosas descontinuidades da interação face a face, vamos ver algumas características que nos deixarão contextualizados.

2.Características próprias da interação face a face

A conversação é um jogo. Um jogo coletivo onde cada passe é importante para seu desenvolvimento. Eis aí alguns deles:

  • A fala é localmente planejada, ou seja, ela é planejada ou replanejada a cada novo ‘lance do jogo’;
  • O texto falado é posto ‘a nu’ no processo de produção. Vai sendo construída em sua própria gênese;
  • Há descontinuidades freqüentes que são justificadas pelos fatores de ordem cognitivo-interativa;
  • A fala vai apresentar uma sintaxe própria, uma gramática interacional.

Enquanto que no texto escrito nós fazemos um rascunho anterior, depois uma revisão, depois uma correção para possuir o produto final; no texto falado nós temos o rascunho como produto final. Deu pra entender? Além do mais a interação se trata de uma produção conjunta. O locutor e o interlocutor co-produzem, co-negociam, co-argumentam.

Como é a interação (imediata) que importa, ocorrem pressões de ordem pragmática que acabam por sobrepor-se às exigências da sintaxe. Isso significa que o locutor, frequentemente, vê-se obrigado a “sacrificar” a sintaxe em favor das necessidades da interação, fato que se traduz pela presença, no texto falado, de falsos começos, anacolutos, orações truncadas, etc, bem como a recorrer com freqüência a inserções de vários tipos, as repetições e as paráfrases, com o intuito de garantir a compreensão de seus enunciados pelos parceiros. (KOCH, 2006)

Mas essas “descontinuidades” são, na verdade, “estratégias conversacionais” . Assemelham-se às máximas de Grice.

  • Quando percebemos que o outro já entendeu o que queríamos comunicar, a adição da fala se torna desnecessária;
  • Já quando percebemos que o ouvinte não entendeu, nós repetimos, mudamos o planejamento, inserimos uma explicação;
  • E quando percebemos que erramos em algum termo, nós nos interrompemos e nos corrigimos. Mas também pode ocorrer o fato de o ouvinte nos corrigir.

Essas características citadas acima são as descontinuidades da língua falada (é bom reforçar, amigos) que apontam a “aparente” desestruturação da língua falada.

2. As descontinuidades!!! Eba!!

As descontinuidades são divididas em dois grupos: processos de inserção e processos de reconstrução.

2.1. Processo de inserção

As inserções provocam certa pausa, uma suspensão temporária do tópico (assunto) em curso. Desempenham funções interativas como: explicar, ilustrar, fazer ressalvas, introduzir avaliações ou atitudes do locutor, etc.

Além delas serem realizadas pelo locutor (auto-condicionadas), elas podem ser também hetero-condicionadas. Acontece quando o interlocutor faz uma pergunta ou pede uma explicação ao locutor. Este é obrigado a responder, obedecendo ao princípio de relevância condicional.

Mas se essa inserção não tem nada a ver com o tópico em curso, deixando uma quebra no discurso, aí a chamamos de digressão. Alguns autores chamam isso de “afrouxamento” da coerência textual. Agora, quando a digressão vem introduzida por marcações (como: a propósito, por falar nisso, antes que eu me esqueça, desculpe interromper, mas... etc), o locutor revela que tem consciência de estar provocando uma ruptura no desenvolvimento tópico. Algumas vezes esse fenômeno é usado como descanso num assunto de difícil compreensão. E as digressões não só são iniciadas por marcadores como também são encerradas por estes: “voltando ao assunto”, “mas onde é que eu estava?” . Isso demonstra que essa digressão é realmente apenas um parêntese.

A reconstrução consiste na reelaboração da seqüência do discurso. Provoca também uma diminuição do ritmo da conversação com a volta de recursos já usados. Tem como função formular melhor ou reformular um segmento maior ou menor do texto já produzido. Serve para solucionar problemas detectados pelo locutor ou pelo interlocutor. São: correções ou reparos, repetições, parafraseamentos e adjunções.

A reconstrução consiste na reelaboração da seqüência do discurso. Provoca também uma diminuição do ritmo da conversação com a volta de recursos já usados. Tem como função formular melhor ou reformular um segmento maior ou menor do texto já produzido. Serve para solucionar problemas detectados pelo locutor ou pelo interlocutor. São: correções ou reparos, repetições, parafraseamentos e adjunções.



2.2 Processos de reconstrução

2.2.1 Correções

São cortes feitos para consertar o que não pode se apagar. Geralmente se interrompe o quanto antes o discurso para se apresentar a forma que considera a mais adequada.

Podem ser também hetero-condicionadas. O interlocutor mostra estranheza e sugere explicitamente a correção.

2.2.2 Adjunções

Ocorre quando o locutor percebe que deixou de acrescentar uma informação importante que irá facilitar a compreensão do discurso. Ou completa uma informação incompleta. Reaviva na mente do interlocutor algo que já foi dito anteriormente, dá ênfase a algum aspecto relevante para um bom entendimento do tópico.

2.2.3 Repetições e parafraseamentos

Fenômenos extremamente freqüentes no texto falado. Desempenham diversas funções.

Fazem parte dos processos de reconstrução e possuem as mesmas funções das correções e dos reparos. Sanam problemas detectados(pelo próprio locutor ou pelo interlocutor) em segmentos enunciados anteriormente: parafrasea-se o que foi dito, quando se vê que o outro não entendeu a mensagem. Repete-se o enunciado para não haver mal entendidos quando há ruídos externos ou distrações do parceiro.

Em sentido amplo, pode-se dizer que a repetição engloba desde a repetição ‘exata’, até aquela em que ocorrem variações maiores ou menores na forma e portanto, também a paráfrase. Sendo a repetição exata (isto é, a expressão da mesma idéia com as mesmas palavras e a mesma entonação) bastante rara, pode se incluir a maior parte das repetições entre os processos de reconstrução. (KOCH, 2006)







cabou.. agora é com você, amigo!



domingo, 18 de maio de 2008

Eu quero melzinho

Vivi está doente. Vomitou algo com cor de açaí e acabou de ir ao médico.
Eu também estive doente. Mas ninguém faz caso. Minha mãe mesmo falou: 'Ah, Camila. Tu sempre tá doente'. Meu namorado está com conjuntivite. Meu padrasto com uma érnia (ou seria hérnia?) na virilha. E assim a minha virose fica de ladinho. Nem pra trazer um melzinho pra mim...
O que mamãe fala é verdade (mas ela podia trazer melzinho). Eu sempre estou doente, é incrível.
Nesses últimos meses eu já tive até anemia. Fui no hospital tomar soro. Fiquei tonta na universidade. E assim vai. Pra mim, estar saudável é que é uma novidade. Tosse vem sempre. Mas mamãe podia trazer melzinho.
A minha querida e delicada avó sempre me diz que essas 'frescuras' vão acabar assim que eu casar. Se bem que ninguém da minha família me ajuda a casar, né? Já que espantam todos os meus pretendentes (Rodolfo, eu sei que você me ama e vai ficar comigo até..., né?). Todos falam que eu deveria ser mais doce, mais melosa, mais meiga, mais menininha feita de temperos e perfumada com flores. Concluindo... Se eles me dessem melzinho, tudo se resolveria!
E adianta o meu protesto? 'Camila é doida!', 'Camila é exagerada!'. Uhu! Vou ficar aqui tossindo, exercitando minha barriga (tive até cãibra). Desejo melhoras rápidas ao meu namorado para que ele me VEJA logo. Desejo melhoras a minha irmã que deve estar chorando no hospital agora (tadinha, vomitando açaí). Desejo melhoras ao meu padrasto e não, não quero ver a bendita bruzumba que se aloja na sua virilha, tio.
E mãe... Eu serei uma pessoa mais saudável e doce se a senhora me trouxer melzinho!
^^

quinta-feira, 13 de março de 2008

João Cabral de Melo Neto

Fim da Segunda Guerra Mundial. Início da Era Atômica com as explosões de Hiroxima e Nagasáqui. Cria-se a ONU. Mas logo após vem a Guerra Fria. Também em 1945, ocorre o fim da ditadura de Getúlio Vargas, início da redemocratização brasileira. Mas logo após há o golpe militar. Voltam as perseguições, os exílios...
Surge a geração de 45. Grupo de poetas que se dedicam a uma poesia equilibrada. Longe das "brincadeiras", ironias, sátiras, modernistas. Se preocupavam com o reestabelecimento da forma artística e bela. É aí que surge um dos mais importantes poetas da nossa literatura, não filiado esteticamente a nenhum grupo e aprofundador das experiências modernistas anteriores: João Cabral de Melo Neto.
João Cabral nasce em Janeiro de 1920 (não sei precisamente se seria no dia 6 ou 9). Primo de grandes intelectuais, Gilberto Freyre e Manuel Bandeira. Passa sua infância em engenhos de açúcar: primeiro o Poço de Aleixo em São Lourenço e depois fica no Pacoval e Dois irmãos em Moreno.
Com o início da Era Vargas e por complicações políticas com o presidente Getúlio, Luís Antônio, pai de João Cabral, foi obrigado a abandonar o engenho e partir para Recife. Em 1930, João Cabral, amante compulsivo de futebol, estudou no colégio Marista e foi campeão juvenil pelo Santa Cruz Futebol Clube (1935).
Aos 18 anos já começa a frequentar rodas literárias em cafés, onde conhece Murilo Mendes, no Rio de Janeiro. Este, apresenta o pernambucano a Carlos Drummond de Andrade, entre outros intelectuais.
O ano de 1942 é marcado pela publicação do primeiro livro de João Cabral: Pedra do Sono.Um livro influenciado pelos seus amigos Murilo e Carlos. Já em 45, publica O engenheiro, livro que define o rumo de sua obra.
Logo após prestou concurso para a carreira diplomática e serviu na Espanha, Inglaterra, Portugal, Marrocos, França Senegal.
No final a década de 60 é eleito para a Academia Brasileira de Letras na vaga de Assis Chateubriand. toma posse, em 69, da cadeira de número 6 e é recebido por José Américo.
João Cabral era atormentado por fortes dores de cabeça e descobriu que sofria de uma doença degenerativa incurável que faria sua visão desaparecer aos poucos. Logo então anunciou que iria parar de escrever. Morre em 1999, aos 79 anos, sem ver o seu time do coração (América) voltar a seus dias de glória.
Enfim. Quanto ao seu estilo de escrita os críticos chamam a Geração de 45 o grupo de artistas desligados da revolução artística de 22 e que recuperam certos valores parnasianos e simbolistas. São poetas não-catalogáveis. O que deixa mais fácil analisar cada autor isoladamente, pois a única coisa que os deixam próximos é o aspecto cronológico.
João Cabral , por sua vez, é objetivo e real. Podemos notar que se inspira no nordeste (sua região natal), na Espanha (onde encontra muitos pontos em comum com o nordeste) e com a arte plástica, tendo destaque o pintor Juan Miró!

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

A solução

Era a hora do almoço. Eduardo e Edja colocavam a mesa. Camila lia a 'superinteressante' no sofá da sala. Vitória na rede se deliciava com 'o guia do mochileiro das galáxias'. Lucas tocava violão e cantava desafinadamente, no quarto, a música da sua banda 'sunset'. André...? Ah, que pergunta...
- Crianças!!! Preparados para mais uma jornada gastronômica? - disse Eduardo com empolgação.
- Ai, amor. Foi tão rápido hoje, né? - disse Edja manhosa.
Geralmente a família almoça nos domingos às 2, 3 da tarde. Neste dia estavam a mesa de 12:00 em ponto! Camila é a última a chegar na cozinha. Eduardo, sentado na ponta da mesa fazia uma expressão metida. Edja, olhando com carinho a comida, fazia declarações de amor ao marido. Lucas cantava e batucava a mesa, na outra ponta. Vitória tirava do prato com nojo os pimentões, tomates e outras coisas não criançais. Camila olha pra mãe, dá uma piscadela e diz:
- Tio Dudu, eu tenho algo aqui que pode mudar as nossas vidas!!! - Camila segurava a revista e a balaçava freneticamente. Tinha lido uma reportagem sobre uns tais de ' freegans' (free + vegans). - Vamos nos tornar freegans!!! Eles reaproveitam a comida, não pagam aluguel, são felizes, etc.- Mostrou a página da reportagem. Tinha uma foto de uma mulher num latão de lixo recolhendo rosquinhas velhas.- Existe até uma comunidade freegan aqui no Brasil, a 'erva daninha'. Na revista fala que eles organizam um grande jantar todas as noites logo após a colheita de restos de feira livre.
Edja olhava assustada. Lucas nem ligava. Vitória concentrada na seleção de pimentão. Eduardo olhava fixo para a porta pensativo. - Pois, é, Edja... Aline Barros costuma usar tenores nas suas músicas para preencher... - falava Eduardo desprezando as feições de desgosto da enteada.
- Camila, quer a minha verdura? - perguntava Vitória à irmã desconsolada. Ninguém riu da brincadeira da coitada.
Passou-se o tempo. Discutiram diversos assuntos. Inclusive o desaparecimento do irmão André. Até que:
- Camila, deixe-me ver a revista. - Camila ri baixinho. O padrasto pega a revista, a coloca numa distancia de um braço para facilitar a visão falha. Ele pára. Respira fundo. Seus olhos se enchem de lágrimas. Ouve-se anjos cantando ao fundo. Uma esperança.
- Sim!!! Eis a solução dos nossos problemas!!!!!
Camila entra em desespero... Agora ela seria uma freegan de verdade. 'Como ele pode ter levado a sério', pensava abismada.
- Diga, querido. - disse Edja apaixonadamente.
- Vamos nos tornar freegans!!!!!
Lucas engasgou a comida: - Pai... André já deixou essa vida. E o senhor quer que nós sejamos isso também? Eu gosto de mulher, pai!!! Mulher!!!
- Calma, Lucas... Deixa papai terminar; - dizia Vitória com olhar de admiração.
- Camila, você teve uma ótima idéia! Edja, de agora em diante não vamos mais trabalhar. Moraremos num galpão abandonado. Irei revesti-lo de fibra de vidro, vai ficar show de bola! Teremos nossa própria horta e à noite iremos procurar comida nas latas de lixo! Não será o máximo?! - dizia Eduardo eufórico.
- É isso aí papai!!! Abaixo o capitalismo!!!!!
Eduardo e Vitória pulavam de felicidade. Edja gemia a cada garfada do almoço, como se fosse o último. Lucas chorava embaixo do cabelo e Camila não entendia nada.



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Para maiores informações sobre os freegans brasileiros:
http://ervadaninha.sarava.org/
http://ervadaninha.blogger.com.br/

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

08 de janeiro de 2008
É manhã. Férias. Saco de recesso. Eu sei que a partir do momento que eu pisar na universidade eu vou dizer: 'eu quero recesso'.
Muitas pessoas fazem bom uso desse tempo livre, elas dormem! Mas eu consigo dormir? Não!!! No meu quarto estão duas meninas de 9 anos de idade brincando com qualquer coisa que seja interessante para elas. Agora, neste exato momento, estão concentradas para conseguirem fazer um castelo de cartas de 'Uno'. Claro que após conseguirem elas tiram uma foto, derrubam o castelo e começam tudo outra vez. Eu só queria um pouco de silêncio. No quarto ao lado a minha mãe toca violão. No outr quarto de frente ao dos meus pais, meus irmãos tocam qualuqer coisa que faça barulho. E eu só quero um pouco de silêncio.
Todos estão de férias e todos aproveitam da melhor maneira (brincando, namorando, estudando) esse momento tão precioso de lazer. Eu tenho que começar a procurar outra maneira de descansar que não seja dormir nem comer. Aproveitar que ainda posso vagabundar. Não sou casada, não tenho filhos, nem emprego. Emprego.
Acordei, lavei o rosto, escovei os dentes. Fui pra mesa do café da manhã. Mamãe estava lá.
- Camila, você tem que começar a pensar num jeito de se tornar independente.
Eu penso nisso todo o tempo. Mas minha preguiça não permite encontrar meios para que essa grande realização pessoal possa um dia acontecer. Sempre sonhei em morar sozinha, ter o meu cantinho e não depender de homem nenhum. E o que eu fiz pra tudo isso poder ocorrer? Comi e dormi!
- Minha filha, você precisa trabalhar! Você já está com 19 anos e...
... E com 16 ela já estava trabalhando numa escola chamada IPEP e foi muito agradavel a sensação de ganhar o próprio dinheiro. Lembra que comprou uma calça jeans e um tênis com o primeiro salário. Faz mais de 5 anos que eu escuto isso... Mas essa foi a primeira vez que minha mãe veio conversar comigo sobre eu arranjar um emprego. Fantástico. Mas onde eu posso trabalhar? Trabalhar num shopping feito uma escrava? Não sei... Seria uma opção, né? Estou pensando muito nisso e vejo que realmente é necessario. Putz, claro, né, Camila?
Então... ^^ Quem queiser me contratar pra qualquer coisa, até pra varrer o chão de uma loja... Eu prometo que não vou dormir no trabalho!